quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Busca ativa por pretendentes impulsiona adoção internacional no Rio Grande do Norte


A equipe da Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional do Estado do Rio Grande do Norte (CEJAI/RN) se despediu de dois irmãos adotados por um casal de italianos, em um café da manhã realizado na sede da Corregedoria Geral de Justiça. Os dois fazem parte do grupo de onze crianças e adolescentes que foram adotados por famílias estrangeiras em 2019. O número, mais alto que a média registrada até então, se deve ao novo método de busca ativa adotada pelas Corregedorias do país.

Desde o ano passado, uma nova versão do Cadastro Nacional de Adoção, agora chamado Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), traz a criança como sujeito ativo na busca por pretendentes à adoção. Isso tem sido feito tanto para adoções dentro do território nacional quanto para as internacionais. O sistema encontra para as crianças pretendentes que buscam por um perfil parecido com o dela, não necessariamente igual, para que as chances sejam ampliadas.
O juiz corregedor Diego Cabral, membro da CEJAI/RN, ressaltou que o processo de adoção internacional é extremamente seguro para ambas as partes, principalmente para a criança. “Existe uma convenção por trás que exige uma série de pré-requisitos para serem preenchidos”, explicou.
“Se tem a ideia que o Brasil está se desfazendo de suas crianças, mas não é isso, é preciso desmistificar e abrir os olhos, na verdade a adoção internacional é uma oportunidade para crianças e adolescentes de terem uma família. E notadamente uma adoção internacional é uma alternativa para que essas crianças, que a gente chama de ‘perfil difícil’ na adoção nacional. Quando chega entre os 10 ou 12 anos se percebe uma dificuldade na adoção aqui, mas ainda existem chances na internacional”, completou o juiz.
Agora, com o uso da busca ativa pela Corregedoria, o juiz acredita que cada vez mais crianças possam ter a oportunidade de encontrar uma família. Ele atribuiu o crescimento no número de adoções ao trabalho que se tem feito dentro da Corregedoria em parceria com outros atores importantes no processo. “Foi fruto de um trabalho conjunto, a confiabilidade do procedimento foi fundamental. A comissão estadual tem se envolvido muito fazendo, juntamente com a 1ª Vara da Infância de Natal, a equipe técnica e dos juízes do acolhimento uma busca ativa, que procura fazer esse contato com os organismos internacionais, com as equipes técnicas e com as varas para fazer a vinculação adequada”.
Ineditismo
A servidora Celly Elane, da CEJAI/RN, destaca que o processo de adoção das onze crianças foi inédito pela quantidade, por todas pertencerem a grupos de irmãos, pelo fato de todas já estarem em casas de acolhimento (destituídas do poder familiar, sob a tutela do Estado) e também por terem vindo de cidades do interior.
Cinco famílias italianas adotaram três grupos de irmãos. Segundo Celly a adoção de mais de três irmãos é muito rara, mas os que se separaram durante o processo vão continuar cultivando vínculos, estimulados pelos seus novos grupos familiares.
“No exterior, principalmente, a gente busca manter o maior número de irmãos possíveis juntos”, disse a servidora. “A lei preconiza que eles adotem mediante ao comprometimento de vinculação, eles se encontram nas festas, nas férias, via internet, para não perderem o contato, fazem isso por amor e por comprometimento dos pais”, completou Celly.
Despedida
Os irmãos G.P., de 11 anos, e A.E., de 5 anos, não pareciam tímidos junto aos seus novos pais, afinal, as crianças passaram 30 dias em Natal convivendo diretamente com eles. Antes disso, já estavam se comunicando por videoconferência desde que a busca ativa formou a nova família. Os pais, italianos, compraram uma camisa do time de futebol favorito do filho, decoraram o quarto da filha com personagens de seu desenho preferido. Mesmo antes de se encontrarem, o vínculo entre eles já estava estabelecido.
O estágio de convivência mínimo de um mês é obrigatório para todos os casais internacionais que buscam a adoção no Brasil. Agora, ao fim desse período, eles estão prontos para prosseguir com o processo e levar os filhos para o novo lar.
O corregedor geral de Justiça, desembargador Amaury Moura, chamou atenção dos presentes no café da manhã para dizer o quanto ele estava feliz em estar presente na oportunidade.
“Realmente é um momento que emociona, é um momento sobretudo de demonstração de amor, é uma família que recomeça. A gente percebe a satisfação e vê no semblante do casal essa alegria, esse ar de felicidade quando adota. No contato com as crianças a gente vê que eles estão ali realizando um sonho e isso é o que é mais importante, esse gesto de amor que leva ao caminho para a felicidade, para a convivência em família com pai e filho e que tem que ser sempre amparada pelo amor”, comentou o desembargador.
Amaury Moura pontuou que além da parte burocrática, a CEJAI lida com emoções. “Nós que lidamos com isso no dia a dia, no trato e no procedimento das ações de adoção, nos realizamos profissionalmente e como ser humano. Vemos nesse gesto a grandeza do casal, adotar de uma vez só outro casal de crianças que vão agora ter seu lar e enfim serem felizes”, completou o presidente da CEJAI/RN.
Estágio de convivência
O casal de italianos, agora pais de duas crianças, comenta que o estágio de convivência foi fator determinante para que eles pudessem escolher o Brasil como o país em que procurariam por seus filhos. “Eu achei muito importante, pois é um período que a criança vai aproveitar com os pais e vai se adaptar dentro do país dela, com sua língua e seus costumes para depois ir para a Itália. Imagine se não houvesse estágio de convivência e a criança fosse direto para o outro país? Assim não tem o trauma e a criança já se acostuma com o processo”, comentou o pai, Giovanni Carrelli.
A mãe, Lucia, diz que inicialmente só pensavam em adotar uma criança, “mas frequentamos grupos com outros casais e vimos que se a criança tivesse irmãos seria bom mantê-los juntos, para que crescessem juntos, fazer companhia e dar força um para outro”. Sobre o perfil da adoção o casal disse não se importar com todas as exigências que geralmente são feitas. “A cor da pele não é importante e nós não queríamos uma criança muito pequena. Quanto ao sexo, a gente não escolheria também se fosse biológico então não é importante para nós”, comentou Lucia.
Giovanni salientou que durante o período de convivência eles se comportaram como eles mesmos, para que a adaptação fosse natural. “Tanto nas partes boas quanto ruins. Como qualquer pai falando, por exemplo, se vamos comprar determinada coisa ou não, se precisar colocar de castigo colocamos. Tudo muito natural”, explicou.
O advogado do casal, Marco Baroni, é representante da Il Mantello, uma organização internacional que atua na Itália, na Bulgária e tem representantes nos estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina. Ainda na Itália, eles iniciaram o processo de adoção junto a Commissione per le Adozioni Internazionali (CAI), o órgão equivalente à CEJAI no país.
Procedimento Adoção Internacional
Para se habilitar para adotar uma criança no Brasil, o estrangeiro deve primeiro fazer o processo no seu país de origem. Lá, seguindo a legislação local, eles informam o perfil e é realizado um estudo psicossocial.
Depois, o país em questão encaminha todo o dossiê do pretendente, por meio do organismo internacional, para o órgão responsável no Brasil. Eles se submetem a um segundo processo de habilitação por meio da CEJAI, composta por um colegiado que é presidido pelo corregedor geral de Justiça, dois magistrados e um membro representante da OAB. O Ministério Público também analisa toda a documentação.
O processo de habilitação leva no máximo 40 dias se toda a documentação entregue estiver correta. São seguidas rigorosamente as determinações do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do regimento interno da CEJAI.
Depois de todos os passos de segurança, os pretendentes recebem um laudo de habilitação com validade de um ano. Então, por meio de seu advogado, podem dar entrada na esfera judicial do processo quando a criança é escolhida. A 1ª Vara de Infância e Juventude de Natal é a única do estado que tem competência para realizar esse processo, e o juiz responsável, José Dantas de Paiva, também faz parte da CEJAI.
Realizada a entrada no processo de adoção é marcada uma audiência, onde é deflagrado o prazo de 30 dias de estágio de convivência. O casal tem que ficar esse período mínimo no país, convivendo com a criança. A equipe técnica da 1ª Vara vai até o local onde eles estão, realizando várias visitas durante esse período, para fins de acompanhamento. Ao final a equipe faz um relatório que fica anexado ao processo. O Ministério Público, de posse desses documentos, vai deferir ou não o processo de adoção. Em caso positivo, o juiz marca uma nova audiência, escuta todas as partes novamente e dá a sentença.
O processo então volta para a esfera administrativa, na CEJAI, onde o Corregedor emite o último documento, o certificado de conformidade, dizendo a todas as autoridades dos dois países, inclusive a Polícia Federal, que todo aquele regulamento está de acordo com a Convenção de Haia, com o Estatuto da Criança e do Adolescente e com a Constituição Federal, é um documento de segurança. Feito isso é finalizado o processo de adoção, mas a nova família deve enviar semestralmente, por dois anos os relatórios semestrais pós adotivos.
TJRN

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